quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Mais um amigo que se foi

                                                                                 

Neste Finados, meu pensamento se volta para um amigo que se foi há pouco, o Chico Mattos, cujo talento muito me ajudou depois que me tornei, em 1991, o primeiro presidente da Fundação Museu da Imagem e do Som (MIS). Coube a ele, inclusive, com a sua competência de publicitário, a concepção do primeiro fôlder da então recém-criada fundação.


Quase sempre bem-humarado, por vezes dramático e até sarcástico, Chico era uma presença valorizada no convívio de trabalho, que, não raro, se estendia a algum dos bares da Lapa. Antes da saideira, não podiam faltar as suas inesquecíveis declamações, de que o nosso amigo comum Maurício Azedo, presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), fala abaixo.

                                                                  Arthur Poerner


Chico Mattos, um fã de Guillén



Na juventude, no Rio de Janeiro, com pouco mais de 20 anos, o alagoano Francisco Ribeiro Mattos pensou em ser advogado e com esse fim chegou a prestar vestibular , na Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil e na antiga Faculdade Brasileira de Ciências Jurídicas. Na verdade, esse projeto não correspondia a uma vocação ou uma sedução pela atividade de advogado, mas a certo modismo: seus mais fraternos companheiros da União da Juventude Comunista-UJC, a que se vinculara cedo, optavam pelo caminho do Direito e ele não queria afrouxar esses laços de companheirismo.

Se a advocacia perdeu um combativo profissional, a publicidade ganhou um quadro criativo e competente. Também muito cedo, Chico, ou Chico Mattos, como era conhecido, mudou-se para Salvador, onde se associou a um conterrâneo, Murilo Vaz, e a outro jovem profissional, para criar uma das primeiras agências de publicidade da Bahia, a GFM, cuja razão social reproduzia as iniciais de seus criadores: Gama, Francisco e Murilo. A sociedade foi boa enquanto durou, até que os três pioneiros se convenceram de que a escassez de capital não lhes permitiria enfrentar as concorrentes economicamente poderosas que descobriam o mercado baiano. Chico voltou então para o Rio de Janeiro, onde mergulhou de cabeça no mundo da publicidade e teve atuação destacada em agências do prestígio, como a Denison Propaganda, de que foi um dos principais profissionais.

Certa proximidade entre publicidade e literatura levou Chico a se familiarizar com a última, e especialmente com a criação poética. Aos que o ouviam declamar poemas que selecionava com extremado bom gosto literário ocorria sempre uma interrogação: como podia alguém, como ele fazia, declamar com tanta adequação de tom, pausas e melodia criações poéticas alheias? Em algumas destas, Chico era insuperável, como na recitação dos poemas do cubano Nicolás Guillén, de quem era admirador e cuja obra conhecia como poucos no Brasil. O próprio Guillén se surpreenderia com o acento dramático que, com sua voz gutural, seus dotes de ator, sua capacidade de emocionar e se emocionar, Chico emprestava às suas criações.

Engajado politicamente desde a mocidade, Chico Mattos participou ativamente das disputas eleitorais travadas no Estado do Rio de Janeiro a partir de 1978, quando as correntes progressistas do antigo Movimento Democrático Brasileiro-MDB elegeram para a Câmara dos Deputados combatentes da expressão de Modesto da Silveira e Marcelo Cerqueira. Filiado a partir de 1982 ao Partido Democrático Trabalhista-PDT de Leonel Brizola, ele foi assessor comunitário do Secretário de Estado de Trabalho Carlos Alberto Caó de Oliveira Santos no primeiro Governo Brizola.

Chico Mattos faleceu no dia 25 de junho no Rio de Janeiro, de complicações decorrentes de uma cirurgia cerebral. Deixou um filho e duas filhas, uma das quais lhe proporcionou grande alegria nos últimos anos de vida: foi a primeira colocada na prova de conclusão do curso do Instituto Rio Branco e oradora da turma de novos diplomatas, em solenidade presidida pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.


                                                                               Maurício Azedo



Jornal da ABI nº 368, julho 2011

Um comentário:

Cláudia Mesquita disse...

2 de novembro de 2011 23:23

Querido Poerner, sinto muito o falecimento do Chico Mattos, doce e inesquecível figura.
Beijos.
Cláudia