sexta-feira, 28 de março de 2014

Rememoração: "Cartola convida"


       Em meados de 1970, quando pude, enfim, deixar o quartel da PE no Andaraí, sede do DOI-Codi no Rio, voltei à Redação do Correio da Manhã, onde havia sido preso há mais de três meses, mas fui logo demitido. O diário que liderou até o AI-5 a resistência à ditadura, estrangulado pela repressão e pelas forças econômicas que a apoiavam, tivera que ceder ao arrendamento pelo então futuro governador Marcelo Alencar e seus dois irmãos, engajados na campanha para tornar presidenciável o coronel Mário Andreazza.
      Amigos jornalistas, como o Milton Temer, se empenharam, com denodo, mas sem sucesso: nem na Última Hora foi possível dar continuidade à minha vida de assalariado desde os 15 de idade. Além de estar sem liberdade, obrigado a me apresentar todas as quinta-feiras no Ministério da Guerra, e sob vigilância residencial permanente, fiquei também sem emprego.
      Foi quando, para contornar as pressões que tornavam inevitável a minha saída do país, os amigos do samba Jorge Coutinho, Haroldo de Oliveira e Leléu da Mangueira entraram em ação. Daí nasceu, com o então já meu amigo Cartola, o show "Cartola convida", tema dos textos do Sérgio Cabral e do Waldinar Ranulpho, no Pasquim e na Última Hora, cujos recortes encontrei há pouco, quando procurava para o livro de memórias uma poética e carinhosa correspondência do grande Cartola. Ah, sim, não foi para garantir a minha sobrevivência profissional nem a política, mas o "Cartola convida" deu para fortalecer ainda mais a da minha alma.


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