domingo, 16 de novembro de 2014

Leandro Konder, um pensador marxista


      Bem que o jovem porteiro maranhense me avisou, quando voltei de um encontro externo, que havia morrido "um filósofo importante". Logo eu saberia que se tratava do Leandro Konder, um amigo de meados dos anos 1960, parceiro na heroica e, afinal, malograda tentativa de resistência à ditadura pelo semanário Folha da Semana,  com quem estreitei convivência durante o exílio na Alemanha, onde ele chegou dois anos depois de mim, em 1972, após haver sido preso e torturado no Brasil.
      Na volta do exílio, com a desintegração do PCB, onde ele militara por 31 anos (1951/1982), trilhamos caminhos partidários diferentes: ele, no PT, onde já não o encontrei ao deixar o PDT, em 2006, após a morte do Brizola. Havia migrado para a fundação do PSOL, com um querido amigo comum, o Milton Temer, este dos meus tempos da Marinha. Nada impediu, contudo,  que fossem sempre muito ricos e bem-humorados os reencontros que tivemos, como o da entrevista que fizemos com ele, em sua residência, para a revista O Pasquim 21. Para isto, certamente contribuiu o fato de compartilharmos algo de mais essencial: a tese de que o capitalismo jamais conseguiu responder às críticas que lhe fez Karl Marx, um pensador do século 19. O que não significa que tenham sido, plenamente, corretas e acertadas as alternativas às críticas postas em prática até agora.
      Formado em Direito, como eu, Leandro se doutorou em Filosofia no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da   UFRJ, em 1987, e se tornou, a seguir, professor dos Departamentos de Educação da PUC/RJ e de História da UFF. Mas, ficará mesmo na memória nacional como um dos mais notáveis estudiosos brasileiros do marxismo, especialmente da obra do filósofo e político humanista húngaro  György Lukács, discípulo de Hegel que se notabilizou pela criação de uma estética marxista. Leandro deixa vasta obra sobre o socialismo, com livros como "Marxismo e alienação" (1965), "Marx, vida e obra" (1968), "A democracia e os comunistas no Brasil" (1980) e "A derrota da dialética" (1988). Se tivesse que sugerir algum ao Welerson, o porteiro, a quem já andei emprestando alguns livros, seria "O que é dialética", o mais popular, se é que podemos usar o adjetivo para obras filosóficas.
     Ele morreu na terça-feira, 12, aos 78 anos, de complicações decorrentes do Mal de Parkinson, de que padecia há cerca de 20 anos. A última vez em que nos falamos foi quando lhe telefonei, na primeira metade do ano, para dar-lhe os pêsames pela morte, em São Paulo, do Rodolfo, seu único irmão, jornalista e escritor de quem também fui amigo.

Arthur Poerner

12 comentários:

Monique Franco disse...

Perda enorme. Presença eterna.

Henrique Perazzi de Aquino disse...

Bela homenagem

Ana Regina Segura Lima disse...

UMA PENA MAIS UMA PERDA

Jayme Souza disse...

Depoimento emocionante !

Leniza Castello Branco disse...

Quantas perdas importantes este ano! bj

Zelia Stein disse...

Que descanse em paz! E que suas reflexoes continuem construindo pontes para que os brasileiros possamos nos repensar como projeto de Naçao e líder Regional. O Brasil... ai quanto falta ainda de caminho a percorrer.

Myriam Hudson disse...

Desculpe a ousadia, Arthur, mas não resisti. Compartilhei.

Marcos Rocha disse...

Pessoa muito estimada e importante intelectualmente para mim como professor do curso de história da UFF que foi. Sinto gratidão por tê-lo conhecido. Mesmo os muito grandes se vão.


J Luiz C Pereira disse...

Falando de Karl Marx, você já leu "O Capital" (No Século XXI) de Thomas Peketty? Uma obra muito interessante.

ARTHUR POERNER disse...

Obrigado, Myriam, pelo compartilhamento. O ideal seria que todos pudessem avaliar a importância do pensador que perdemos.

ARTHUR POERNER disse...

Não, José Luiz, ainda não pude ler "O capital no século XXI", do Piketty, mas já soube, pelo Veríssimo, que, segundo este importante trabalho do pesquisador francês, com o capitalismo atual, vai aumentar, cada vez mais, a já imensa e assombrosa distância entre os ricos e os pobres no mundo. Sepultando, definitivamente, conforme concluiu o cronista e humorista gaúcho, aquela antiga balela de que só o mercado livre pode nos trazer a felicidade. Aliás, até pode, mas somente para uma ínfima minoria de que jamais faremos parte. Abração

http://www.facebook.com/sergio.braga.9 disse...

Falta um bom estudo ainda sobre a Folha da Semana, Poerner. Meu pai, Laudo Braga, foi direitor-gerente do jornal. Era um grande admirador seu. Estou procurando fazer um estudo sobre ele, mas não encontrei muita coisa.